domingo, 26 de agosto de 2007

Uma questão de nervos - Alma de campista


As férias chegaram ao fim. Depois de vir do campo, fui acampar para perto da praia de Odeceixe.
Sim, sou um campista. Contudo, por mais que tente, nunca conseguirei assimilar aquele espírito comunitário.
Tive a “sorte” de ficar num lugar estratégico, ladeado por um grupo de espanhóis “divertidos” e por um campista dos puros, dos que gostam de fazer tudo em comunidade.
O grupo de espanhóis, liderados por um tal de “Raúllll”, mostraram rapidamente a sua alegria. Passavam alguns minutos das quatro e meia da manhã quando o famoso Raul entrou aos berros no parque. Alcoolicamente “satisfeito” mostrava a sua poderosa voz, arrotos e outros sons que não consegui identificar. A festança era das grandes, e apesar de normalmente paciente, quis demonstrar o meu descontentamento . Para tal, utilizei um dos mais antigos códigos campistas, o chamado “abrir e fechar da tenda” como que a dizer: “E que tal fazerem pouco barulho, são cinco da manhã e existem aqui pessoas que querem dormir”. Esta acção teve um efeito imediato, apesar do estado alcoolizado, Raul compreendeu, e por alguns momentos fez-se silêncio.
Voltei a dormir.
Passada meia hora, o nosso amigo Raul volta a fazer das suas. Sempre com a sua voz colocada, voltou a acordar-me, não só a mim, como também ao resto do parque. Ao que parece, a conduta campista neste tipo de situação passa por não fazer nada. É então que a minha tenda volta a abrir e a minha mais que tudo, solta um forte “não vêem que são 5 da manhã!”. Raul mostrou-se inabalável face ao confronto directo, e decidiu deslocar-se da sua tenda para a casa de banho. No caminho tropeça na tenda do nosso amigo “campista dos puros” e cai literalmente sobre a mesma. Foi neste momento que pensei, “agora é que alguém vai colaborar connosco e vai finalmente ouvir-se uma repreensão alheia”. Contudo, para grande surpresa minha, o que ouvi foi algo como: “Então amigo, tu não estás bem. Precisas de ajuda? Tens é que te deitar...”. Para mim foi como que uma lição do que é ser campista. Apesar do caos que se estava a gerar graças ao nosso amigo Raul, o verdadeiro campista mostra sempre a sua compreensão e inter-ajuda. Esta era uma situação que requeria a máxima colaboração e a simpatia de todos. Acho que a solução para a paz no mundo está no parque de campismo. Se todo o mundo partilhasse este espírito, o médio oriente seria um paraíso.
Meia hora depois, chega um grupo de jovens que tinha acampado mesmo ao nosso lado durante a tarde. Às 5h30 da manhã, enquanto o Raul se deliciava com um bom momento de gregório nos balneários do parque, os mais recentes moradores compensaram-nos com uma sinfoneta campal integrando um excelente quarteto de sussurros, risinhos, fechos persistentes e uma excelente batida de enchimento de colchão ao ritmo do um bom rebolar e roçar nos diferentes plásticos da tenda. Foi aqui que tivemos que colocar em prática a mais ancestral das técnicas de silêncio -“o shushing”. Do interior da minha velhinha tenda canadiana saiu o mais belo “shhhhhhhhh”. O que me tornou no mais aclamado “shusher” da noite. A minha tenda comparava-se a um país que se preparava para entrar em conflito com todos os que lhe faziam fronteira.
Na manhã seguinte a tensão era grande, como na guerra fria. À pala de uma beata que me queimou a manta colocada em frente à tenda e de uma noite mal dormida, decidimos fazer a vida negra ao inimigo. Naquela manhã solarenga deu-se inicio a uma nova fase deste conflito. Das nossas trincheiras fizeram-se ecoar rajadas de assobios, bombardeios de gritos de comando e o roçar insistente dos sacos de plástico mais enervantes da história dos conflitos mundiais.

Foi uma manhã épica.

1 comentário:

Rita Maria disse...

Joana a presidente!